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Confira aqui as coberturas exclusivas de nossas lives!

Debate sobre juventude e coletivos foi tema da primeira live do OCCP

Na última quinta-feira de novembro (26), aconteceu a estreia de uma série de lives organizadas pelo Observatório de Coletivos Culturais da Periferia de São Paulo (OCCP) em conjunto com o Centro de Estudos Latino Americanos de Cultura e Comunicação (CELACC). O evento foi mediado pela Prof. Ms. Juliana Salles e Mariana Caires, e contou com a participação dos Professores Dr. Dennis de Oliveira e Ms. Renato Almeida, e os integrantes de coletivos Pedro Oliveira, Black Nandão, Lucimara Fonseca e Douglas.

“Ali me reconheci como produtora cultural. Não era isso que eu falava.”

 

Lucimara iniciou a rodada de falas apresentando sua história e vivências em coletivos culturais. A partir disso, Juliana questiona quais foram os momentos mais marcantes dessas experiências e aproveita o momento para citar alguns deles, como a produção da sua primeira exposição cultural e a criação do coletivo Mulheres de Oli. 

 

Além desses, a educadora relata sobre uma roda de samba em que tocava com o grupo Samba das Pretas, composto unicamente por mulheres negras e, no ambiente, estavam cercadas de homens. Lucimara conta que a postura de um deles era completamente intimidadora e causou desconforto tanto nela, quanto nas companheiras: “Se você é preta, você tem que saber tocar, porque você veio de lá [da periferia]”, comenta. 

 

Esse mesmo homem também quis ensiná-la a como tocar o repique, o que também contribuiu com seu constrangimento. Ao fim de tudo, em um evento posterior em que ambos estavam presentes, a convidada citou o ocorrido e apontou a atitude dele como machista, fato que, segundo ela, deixou-o extremamente sem graça. Esse relato, trazido pela educadora, foi um dos pontos fortes do encontro.

“A luta nunca foi uma opção para nós, sempre fez parte da nossa vida”

Pedro Teixeira, coordenador do coletivo Cine Campinho, também trouxe seu ponto de vista sobre o tema. Morador de Guaianases, Zona Leste de São Paulo, desde cedo participou de ações voltadas à cultura hip hop, como oficinas de grafite e aulas de break. Frente ao aprendizado e da falta de iniciativas similares no local onde vivia, Pedro procurou passar os ensinamentos adiante. “Esse pouco [que aprendemos] tentávamos multiplicar, trazer pro nosso bairro. Até montamos uma rádio comunitária por aqui”, conta.

 

O coordenador também conta como surgiu a ideia de criar o coletivo. De acordo com ele, as políticas públicas que chegavam na região eram escassas e não ofereciam a vivência de uma juventude com bons recursos. A escolha pela área audiovisual como foco se deu por ser uma linguagem de difícil acesso aos moradores e, com isso, buscavam uma aproximação da periferia de Guaianases das artes cinematográficas. 

Diante disso, o Cine Campinho surge em 2007 para oferecer sessões de cinema gratuitas aos moradores e aprofundamento nos conceitos técnicos da sétima arte, tudo oferecido em um campo de futebol de várzea no local. Desde então, Pedro conta que, além de oferecer para o público uma nova atividade cultural, o coletivo também contribuiu com melhorias estruturais no campo utilizado e, também, movimentações e diálogos com outros coletivos.

“Não cantamos coisas lindas nem rimamos coisas belas, apenas as realidades das favelas”

Black Nandão foi o terceiro convidado da noite, para falar sobre a história do Ideologia Fatal, grupo formado na comunidade Jardim São Remo, na zona leste/oeste de São Paulo.  Criado em 1995 por Mano Li, o Ideologia Fatal é voltado para a expressão cultural através da música, e a partir dela, busca trazer mensagens positivas e novas perspectivas para a população.

Apesar do início ter se dado em 1995, Black Nandão conta que chegou ao grupo apenas dois anos depois. Ele relata que era DJ em bailes black da periferia e já fez parte de um grupo de rap anteriormente, porém, o projeto não deu certo. Um pouco depois, Nandão conhece Mano Li e, juntos, começam a tocar em festas na comunidade, cantar juntos, e então, tudo começou.

O convidado conta também que, em 2014, o Ideologia Fatal teve a iniciativa de inaugurar o coletivo “Sarau Composição Urbana” como uma alternativa de atividade cultural aos moradores do

Jardim São Remo. Com vários apoios externos, o grupo viu a oportunidade de contribuir com a melhoria do lugar em que vivem: “Vimos a necessidade de transformar o local, trazer brinquedos para a praça, agregar cultura à comunidade”, relata. Durante sua atuação, o Sarau trouxe vários nomes ilustres da música para seus encontros, produziu um CD e o documentário “Além dos Muros”, além de muitas outras atividades.

“Desde os quilombos, aprendemos que unidos ficamos em pé, e divididos, caímos”

Douglas, das Ocupações Culturais Mateus Santos e Hermelino Matarazzo, finalizou os relatos sobre experiências do grupo. No início da fala, Douglas conta que nem sempre teve em mente o que era o princípio de “coletividade”, e que isso se deu com práticas como o skatismo e grafite, muito presentes em sua infância e adolescência:  “No grafite, temos a lata individual de cada um e as coletivas, que são do grupo. Pensando nisso, vi que existem muitos coletivos que não se reconhecem como tal”, afirma.

 

Um dos momentos mais marcantes da live foi o recital de uma poesia escrita por Douglas, a qual aborda as diferenças entre jovens de elite e periferia e a adoção de uma identidade equivocada de jovem periférico feita por indivíduos com interesses próprios. Voltando a falar sobre coletividade, ele traz ao assunto a Associação Leão de Judá, uma associação de reggae em que atuou organizando campeonatos de skate para o público, que contou até com a produção própria da pista para a competição. 


Após vários campeonatos de skate, Douglas e a Associação Leão de Judá fundaram juntos o “Mobilize”, um espaço independente que oferecia oficinas culturais, como as de grafite. Nesse momento, ele conta ainda não se via como produtor cultural, pois mesmo que essas atividades estivessem presentes em sua vida desde cedo, tudo era uma válvula de escape para a sua principal prioridade: o trabalho. “Eu era distante da literatura e escrevia meus raps escondido. Para mim, era um crime eu não terminar a escola e escrever poesia”.

Hoje, Douglas trabalha na Ocupação Mateus Santos, rede com mais de 75 coletivos com propostas variadas. Além disso, ele também é responsável pela organização do Slam Fluxo e pesquisador do projeto “Zona Leste Sem Registros”, que une cerca de 100 homens e mulheres para o mapeamento das iniciativas culturais da região e deu origem a um livro de mesmo nome. “[No livro] mostramos a diferença que há entre nós, periféricos privilegiados, e a galera que produz por necessidade individual.

“Precisamos fazer ações não para conter a força dos jovens, muito pelo contrário, precisamos para fomentar”

Após todos os depoimentos, o Prof. Ms. Renato Almeida dá uma perspectiva geral sobre o debate. Tendo como base a poesia de Douglas, Renato aponta a postura abusiva da academia em relação à periferia, usando as informações coletadas em campo como benefício próprio. 

 

Em cima disso, o professor aborda a diferença entre a juventude periférica dos anos 1990 e a atual. Citando o lema do Quilombo Periférico “Nada sobre nós, sem nós”, ele afirma que, antigamente, a periferia não falava abertamente sobre a sua relação com os acadêmicos, mesmo tendo iniciado ali a procura por caminhos para tal. Hoje, em vista da consolidação desse diálogo, os jovens estão muito mais firmes quanto ao aproveitamento negativo das atividades locais para fins unicamente de interesse, e devido a isso, protegem mais as suas produções.

 

Outro ponto importante trazido por Renato ao debate é a constante transformação da periferia e da noção de juventude. Segundo ele, ambas são construções histórico-sociais: “Periferia não foi sempre o que é hoje, da mesma forma que juventude também. A ideia que temos do que é ser jovem também foi se alterando ao decorrer da história”, explica. O professor ainda adiciona que a configuração atual da periferia de São Paulo só se consolidou nas décadas de 1970 e 1980, época de maior movimento migratório para essa área.    

 

Como consequência, Renato afirma que a cultura de periferia vigente foi moldada por essa nova geração que chegou com o inchaço populacional da área. “É exatamente essa geração que começa a criar algo diferente do que seus pais tinham naquele momento”, adiciona. A partir de então, segundo ele, surge o hip hop - como influência da indústria cultural - e outras práticas comuns do gosto dos jovens, mostrando que a experiência de “juventude” está diretamente relacionada ao momento temporal vivido, pois em períodos diferentes, também existem vivências igualmente diferentes.

Confira esses e muitos outros momentos da live no canal oficial do CELACC no Youtube:

Confira a cobertura da 2ª live do OCCP: “Arranjos Produtivos de Comunicação nos Coletivos de Periferia”

Quinta-feira, dia 28 de janeiro, foi a data do segundo encontro da segunda fase do Observatório de Coletivos e Culturas de Periferia. Mais uma vez, o Prof. Dr. Dennis de Oliveira, a Ms. Juliana Salles e Mariana Caires reuniram um time de muita experiência para debater sobre os “Arranjos Produtivos de Comunicação nos Coletivos de Periferia”.

 

Além da presença da equipe do OCCP, Pedro Oliveira, Lenne Ferreira, Lucas Velloso e Aline Rodrigues, respectivamente, representando o Cine Campinho, Alma Preta Jornalismo, Agência Mural de Jornalismo nas Periferias e Periferia em Movimento, marcaram presença na última live do projeto.

Conheça um pouco mais sobre os convidados

Pedro Oliveira - que já esteve presente na live anterior - é morador de Guaianases, Zona Leste da Cidade de São Paulo. Lá, Pedro é um dos responsáveis por coordenar o Cine Campinho, coletivo periférico de conteúdo audiovisual que geralmente promove encontros em um campo de futebol de várzea da região, que inspirou o nome da iniciativa. A partir desse contato, o coletivo busca não só aproximar a linguagem audiovisual dos moradores da periferia local, mas também incentivar o senso crítico da população para os problemas da comunidade por meio da arte.

A jornalista Lenne Ferreira é de Pernambuco e, atualmente, atua como editora no Alma Preta. Além disso, também é idealizadora do “Afoitas”, coletivo pernambucano de comunicadoras negras, e da Aqualtune Produções, agência de gerenciamento da carreira de mulheres negras periféricas. Lenne, além de jornalista, editora e produtora, é mãe e apaixonada pela cultura nordestina, a qual busca registrar em suas narrativas na profissão.

Lucas Velloso é mais um dos jornalistas do time. Também morador da Zona Leste da capital, Lucas é um dos integrantes da Agência Mural de Jornalismo das Periferias, projeto voltado à produção de conteúdo informativo com foco na dinâmica periférica, realizada a partir da cobertura dos bairros e cidades da Grande São Paulo.

Por fim, Aline Rodrigues é produtora do que chama de “jornalismo de quebrada” e moradora do Campo Limpo, na Zona Sul de São Paulo. No Periferia em Movimento, iniciativa da qual participa desde o seu início em 2009, Assim como Lucas, Aline conta que a produção parte das perspectivas e demandas da população, mas em seu caso, o foco é o extremo sul da cidade de São Paulo.

Por que a comunicação periférica?

Diante do jornalismo tradicional que por si só já tem a proposta de informar a população, é comum questionar o que faz necessário que ele seja dividido em vertentes, como o caso do jornalismo periférico. Na conversa do último dia 28, a resposta foi consenso: não basta apenas oferecer informação à periferia, mas principalmente, sobre a periferia.

 

Lucas Velloso, durante o debate, aponta para a importância do conteúdo produzido dentro das periferias também seja consumido dentro delas. Dessa forma, o indivíduo é incentivado a ter um novo olhar a respeito de sua comunidade e buscar por melhorias. Assim, segundo o produtor da Agência Mural, o jornalismo também permite a identificação por parte do leitor, ao passo que se torna mais acessível.

Pedro comenta que foi com esse propósito que o Cine Campinho surgiu. O primeiro formato foi em uma rádio comunitária, que informava aos ouvintes sobre o estado de Guaianases enquanto moradia.

A ideia, no entanto, teve que passar por reformulações após três interferências da polícia federal, que confiscou o equipamento usado. Após isso, o coletivo também experimentou a educação popular como cenário para incentivar  o debate, mas foi na arte que se estabilizou.

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A partir de então, o organizador conta que o objetivo de promover pautas sociais foi articulado com a temática audiovisual, com o intuito de gerar diálogos sobre a periferia e incentivar a produção artística como legado dos 13 anos de atuação do Cine Campinho.

Lenne, por sua vez, vê o jornalismo independente como instrumento de identificação sociocultural, seguindo a mesma linha de pensamento de Lucas. Diante de sua experiência no jornalismo tradicional, a pernambucana se aproximou da temática periférica a partir de movimentos sociais que o aproximaram do Alma Preta. 

 

Com mais autonomia e liberdade de produção, Lenne afirma que foi possível desenvolver relações fora de seu território e entender como contribuir com ele a partir de diálogos culturais com a comunidade e

juventude, ao mesmo tempo que se “aventura” no jornalismo independente, como gosta de ressaltar.

O lado financeiro

Produção de conteúdo independente não é uma tarefa fácil. Nos casos em que a iniciativa parte de projetos de periferia, mesmo diante de boas propostas, sofrem com a falta de apoio financeiro para financiá-los. Com isso, a execução fica ainda mais delicada.

Os coletivos Alma Preta, Cine Campinho, Periferia em Movimento e Agência Mural de Jornalismo são exemplos desse panorama. Apesar de oferecer conteúdo informativo e entretenimento tendo um público-alvo bem delimitado - os moradores de periferias - vale lembrar que os produtores não podem oferecer mão de obra integralmente voluntária.

 

A necessidade de arcar com as responsabilidades financeiras de suas vidas pessoais faz com que muitos deles em determinado momento tenham de se afastar dessas atividades. No entanto, sem colaboração, não há conteúdo, o que pode implicar - no pior dos casos - na desintegração de muitos coletivos de comunicação. Em Pernambuco, por exemplo, devido à falta de políticas públicas de incentivo financeiro a projetos independentes, Lenne afirma que é um desafio conseguir apoio.

 

Não foi o caso de Aline, Lucas e Pedro. Os convidados contam que na medida do possível conseguiram driblar os impactos das faltas de recursos financeiros para manter seus projetos em funcionamento. Editais de financiamento, mesmo que sejam uma boa alternativa, são eficazes apenas a curto prazo. 

Lucas revela que a Agência Mural também recorre a parcerias e campanhas coletivas. Dessa forma, a ideia é ter várias fontes de arrecadação para manter a sustentabilidade do projeto - e, em consequência, sua produção -  sem maiores preocupações. 

 

Aline, por sua vez, conta que o Periferia em Movimento também não pode depender apenas de um meio de arrecadação, então conta com a multiplicidade de reforços  sempre que possível e com a boa relação entre o projeto e a academia, para criar uma rede de apoio. Foi dessa forma que a sede do grupo foi conquistada, e segundo ela, está em processo de formalização.

 

A respeito do Cine Campinho, Pedro conta que por sete anos a iniciativa funcionou sem nenhum auxílio financeiro, o que dificultava a sua manutenção e ampliação. Porém, ao passo que o apoio finalmente chegou em mãos, foi possível investir em melhorias no campo de futebol em que as atividades aconteciam e na aprimoração técnica das produções do coletivo. 

 

O debate dos convidados ainda se aprofundou nas perspectivas sobre o futuro do jornalismo independente, opiniões sobre as possíveis melhorias de estrutura das produções e sobre os diálogos nas comunidades.

Confira a conversa na íntegra:

O que as mulheres têm a dizer sobre os coletivos de comunicação?

A última live do OCCP tratou sobre os arranjos produtivos dos coletivos de comunicação nas periferias, com nomes ilustres que tornaram o debate ainda mais rico. Diante de um tema tão amplo e repleto de perspectivas distintas, apenas duas horas de discussão não foram pouco para abordar os vários pontos importantes da temática. 

 

Em vista disso, reservamos mais uma quinta-feira para prolongar e aprofundar as discussões acerca dos coletivos de comunicação. O dia 28 de fevereiro foi a data escolhida para tal, mas desta vez focando em um recorte feminino de relatos, contando com Ana Fonseca, Dina Ferreira, Lívia Lima, Samira Lima e Thais Silva para falarem em nome das mulheres que atuam na área

Quem eram as convidadas?

No último debate o OCCP trouxe para contribuir com o diálogo quatro mulheres que trabalham diretamente com coletivos culturais e de comunicação. A partir disso, a ideia era mostrar qual é o papel que a figura feminina detém nesse âmbito, suas vantagens e desvantagens e, principalmente, a pluralidade de experiências. 

 

Ana Fonseca é educadora e uma das integrantes do Perifatividade, coletivo localizado no Ipiranga voltado para iniciativas focadas nos direitos humanos, cultura e educação. Apesar de estar há 10 anos no grupo, Ana - que já era produtora cultural antes mesmo de fazer parte do projeto - foi a primeira mulher a compô-lo e permaneceu sendo por boa parte de sua estadia.  

 

Sendo assim, um dos seus objetivos era apresentá-lo à comunidade local para que, dessa forma, cada vez mais pessoas pudessem ser contempladas por suas atividades. Atualmente o Perifatividade tem se dedicado à produção de livros e documentários sobre conteúdos relacionados a sua atuação, mesmo com as dificuldades impostas pelos impactos da pandemia de Covid-19 nas áreas periféricas.

 

A assistente social Dina Ferreira também fez parte do time. Desde 2012 na equipe do Cine Campinho - cujo um dos focos é a produção audiovisual - ela conta que uma das propostas do coletivo é contrariar o estereótipo que a mídia brasileira construiu para representar a periferia. 

 

Assim, além de oferecer oficinas para a população de Guaianases, localização do coletivo, Dina afirma que há também o investimento na profissionalização dos integrantes e no que ela chama de educação comunitária, onde a periferia produz seu próprio conteúdo informativo com equipamentos de qualidade.

 

Lívia Lima é jornalista e uma das integrantes e fundadora do “Nós, Mulheres da Periferia”, veículo jornalístico independente composto por mulheres periféricas e voltado para o público das comunidades. Além disso, Lívia também trabalha com produção e gestão cultural e integra a Agência Mural de Jornalismo das Periferias.

 

Samira Lima, estudante de pedagogia e representante do Grafitti Movie e Cine Quebrada, na Zona Leste de São Paulo, também foi a primeira mulher a compor os times de seus coletivos, assim como Ana. Sobre o Cine Quebrada, Samira conta que já tinha contato com as atividades, até que em 2016 passou a fazer parte da equipe efetivamente.

 

O que começou em um espaço pequeno teve que ser realocado para outro local, em função da alta frequência da população próxima e falta de estrutura para recebê-los. Com isso, o Cine Quebrada passou a funcionar como a ocupação de uma escola abandonada que, tempos depois, foi cedida ao projeto e hoje atua como centro cultural. Atualmente, além do objetivo de continuar a revitalização do prédio, a estudante afirma que as ações do coletivo tem o intuito de resgatar a identidade de quem o frequenta, muitas vezes ofuscados pelo estereótipo de marginal - também citado anteriormente por Ana Fonseca.

Por fim, Thaís Silva é a última convidada da noite a se apresentar. Apesar da formação em química, nada lhe impediu de fazer parte do Quilombaque, localizado no bairro de Perus, em São Paulo. Como co-fundadora do coletivo, Thaís relata que tudo começou em encontros de garagem para a organização de pequenos eventos culturais. 

 

Hoje em dia o projeto conta com a ajuda de abastecimento comunitário, mas ela enfatiza que essa não é a única forma de contribuir com a causa. Os que não conseguem participar financeiramente do Quilombaque podem oferecer oficinas, acarretando em trocas de informação que são consideradas de extrema importância por Thaís para o objetivo do projeto de produzir atividades culturais para a população do bairro.

Conversando sobre os coletivos

Após as apresentações, a equipe do OCCP e nossos espectadores levantaram alguns pontos importantes sobre o assunto: como está sendo o retorno da comunidade em relação aos projetos? Aceitam voluntários? Como são as questões de gênero dentro dos coletivos? Como foram as atuações no ano de 2020?

 

Em relação às questões de gênero, é muito enfatizado pelas convidadas que, apesar de terem conquistado seu espaço na produção comunicacional e cultural, isso não foi uma tarefa fácil. Thaís e Ana apontam a gravidade de serem sempre associadas e lembradas como cônjuges de homens e não pela história e competência individual de cada uma delas. 

 

Além disso, a representante do Perifatividade também ressaltou os desafios de integrar um grupo composto majoritariamente por homens, uma vez que em muitos momentos se viu levantando o tom de voz para ser ouvida em seus posicionamentos. Lívia, por sua vez, destaca o espaço no portal “Nós, Mulheres da Periferia” chamado “Nossas Vozes”, reservado para esse grupo dar seus relatos sobre suas vivências na sociedade atual e oferecer uma experiência de escuta e fala.

 

A respeito do retorno da comunidade, todas falam positivamente sobre  o que recebem em seus coletivos, uma vez que - apesar dos objetivos específicos - é quase unânime que o objetivo geral dos coletivos periféricos é oferecer um espaço de lazer aos respectivos públicos locais. Ana e Dina comentam com alegria sobre as atividades realizadas no Ipiranga e em Guaianases e, principalmente, a admiração dos moradores das comunidades, que sempre participam dos eventos.

 

Diante de toda essa admiração, o recuo de ações presenciais organizadas pelos coletivos em vista das medidas de isolamento social também foi sentido por seus adeptos. Com exceção do “Nós, Mulheres da Periferia” que se trata de um veículo online, todos os outros tiveram que readaptar sua agenda de eventos. 

 

Mesmo assim, Lívia ressalta que o trabalho remoto em consequência do isolamento fez necessária a criação de uma rede de solidariedade, para manter a todos os envolvidos no projeto com a saúde necessária para mantê-lo. Paralelamente, nossas convidadas afirmam que mesmo com os pedidos e questionamento sobre o retorno das atividades tradicionais, sempre estão em busca de alternativas que respeitem o momento de crise na saúde pública ao mesmo tempo que ofereçam acolhimento e conforto à comunidade.

 

Para isso, todas incentivam o trabalho voluntário em seus projetos, uma vez que reforços, além de necessários, permitem experiências renovadoras e maior engajamento nas causas culturais. Através de ações como essas, o que inicialmente é apenas uma contribuição pontual pode se tornar uma participação mais ativa, fazendo com que os coletivos cresçam cada vez mais e as experiências individuais também.

 

Confira o diálogo na íntegra:

Plano diretor é tema do quarto encontro do OCCP

No dia 29 de abril, quinta-feira, foi promovido pelo Centro de Estudos Latino Americanos de Cultura e Comunicação (CELACC-USP) juntamente ao Observatório de Coletivos e Culturas das Periferias de São Paulo (OCCP) uma roda de conversa sobre o Plano Diretor e a produção cultural periférica e suas incidências na agenda política da cidade. Mediado por Pedro Oliveira e Juninho, os participantes debateram a importância de um plano diretor democrático e inclusivo para as regiões periféricas do Estado.

A discussão abordou os problemas da revisão do plano diretor no contexto da pandemia, fato que inviabiliza a participação popular e dos movimentos sociais na discussão do projeto. Tal centralização, por sua vez, concentra as decisões e discussões a uma camada de poder.

Foram convidados do debate Elaine Mineiro, vereadora da mandata coletiva Quilombo Periférico pela cidade de São Paulo; Cleiton Fofão, membro da comunidade cultural Quilombaque e articulador da usina de valores de São Paulo; e Edilson Mineiro, assessor jurídico da União dos movimentos de moradia e conselheiro do Conselho Municipal de política urbana (CMPU). Em conjunto, o grupo discursou, por intermédio dos mediadores, os pontos principais e as dúvidas do público sobre a temática.

Porque é importante a discussão de um Plano Diretor?

“O processo de construção das cidades foi e ainda é um processo articulado por setores dominantes da sociedade em detrimento de outros”

Edilson Mineiro iniciou a roda de conversa com uma contextualização sobre o crescimento das cidades, destacando a importância dos planos diretores não apenas para o benefício das cidades, mas também priorizando o bem estar coletivo da população.

"A cidade cresceu com um planejamento excludente, ou seja, foi pensada para que os trabalhadores ficassem a margem"

Elaine Mineiro também abordou os problemas que surgiram em decorrência do Covid-19 na elaboração do plano diretor para a cidade de São Paulo.

A vereadora destaca a importância da participação popular nas votações na câmara, prejudicada em decorrência da pandemia que resultou no isolamento social da população. Por isso, levando em consideração tais obstáculos, ela afirma que o ideal seria um adiamento da discussão do plano diretor, uma vez que, sem o envolvimento popular não há como discuti-lo de maneira democrática.

“Não há como pensar a revisão do plano diretor das cidades sem a participação popular”

Para Cleiton Fofão, a discussão do plano diretor ainda é um diálogo muito distante das periferias das cidades. Por isso, a revisão do atual plano diretor da cidade de São Paulo é prejudicial especialmente para os setores locais mais vulneráveis. Deve-se pensar, portanto, em um processo de gestão alternativo e renovado que leve espaços culturais para a periferia abordando o desenvolvimento do Brasil pelo olhar da comunidade e dos movimentos sociais.

Após isso, foram apresentados alguns questionamentos aos convidados por parte dos espectadores do debate: qual pode ser o papel da participação popular no plano diretor no que diz respeito à mobilidade urbana com bicicletas entre os distritos das periferias da cidade? Quais são as possibilidades de impedir a votação do Plano para ampliar a discussão com a sociedade civil?

Mesmo com tantos desafios, a discussão é importante para o fortalecimento do enfrentamento ao setor imobiliário e dos poderes conservadores. As universidades e meios acadêmicos são instrumentos fundamentais para a descentralização do debate político e a difusão de conhecimentos para a comunidade, pois dinamizam a discussão dos Planos Diretores e explicitam seu impacto na vida da população, visando um planejamento democrático da cidade de maneira que a periferia seja o centro.

 

Veja o debate na íntegra:

Como que está a disputa pelo benefício dos editais de fomento à cultura?

A cultura como direito

Gil é o terceiro convidado da noite a se apresentar. Com ampla experiência na produção cultural, o gestor contextualiza seu posicionamento falando sobre o cenário da temática nos anos 90, e destaca que a produção artística sempre existiu, e é anterior à existência dos editais. Em relação à atuação das políticas públicas, ele afirma que já melhorou muito comparado aos seus primeiros passos, mas que ainda está longe de ser o ideal.

 

Em um segundo instante, Gil afirma que a cultura é uma espécie de “termômetro” dos direitos sociais gerais. Ele dá como exemplo o ano de 2016, em que houve a redução dos direitos culturais, mas também houve a agravação do desemprego e minimização das políticas públicas. Com isso, o produtor aponta que os editais estão funcionando atualmente como iniciativas de correção, tendo em vista que nos anos 2000, os coletivos tinham medo de reivindicar o dinheiro público, sendo que ele é um direito de toda a sociedade e o governo deve investir nisso, dada a sua importância fundamental.

Por dentro do lado financeiro

A quarta e última convidada da noite é Priscila Nicácio, participante da Comissão de Análise de Projetos do ProAC ICMS, na Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo. Para chegar onde está Hoje, Priscila sustenta um vasto currículo acadêmico conquistado com muita dedicação, o qual começou na Universidade de São Paulo, onde teve contato com projetos culturais. Mesmo tendo contato com a cultura desde a escola, ela conta que foi na USP que entendeu a importância do conhecimento para ocupar espaços e obter autonomia. 

 

Perguntada a respeito de como melhorar o acesso às políticas públicas, Priscila afirma que o caminho é se apropriar dos que já existem. Ela cita a importância da Lei Aldir Blanc como conquista histórica para a área da cultura, uma vez que é o reconhecimento da sociedade e do governo da sua importância. Por conta dessa Lei, o direcionamento de verbas pôde ser ampliado, e segundo ela, no ProAC - responsável por lançar uma inciativa desse porte - todos os projetos que atenderam aos critérios mínimos pedidos foram contemplados. 

 

A servidora ainda comenta que nem toda verba foi gasta, ou seja, muitos outros projetos também poderiam ser beneficiados. Diante de tudo isso, Priscila ressalta a importância do servidor concursado na área da cultura, pois são importantes contribuintes da existência e permanência dos coletivos.

Confira o debate na íntegra:

A última live deste ciclo de debates do Observatório de Coletivos Culturais de Periferias aconteceu no dia 20 de maio, em uma quinta-feira. Mediado pelas integrantes Tâmara Pacheco e Juliana Salles, o evento contou com a participação do gestor e produtor cultural Gil Marçal; do geógrafo e membro da Okupação Cultural Coragem Marcello Nascimento de Jesus; da mestre em história e articuladora cultural Nisia Oliveira; e da assessora técnica de gabinete e membra da CAP, Priscila Nicacio.

 

O encontro foi destinado a colocar em pauta o cenário de busca pelas políticas públicas de fomento à cultura e como os projetos dependentes delas estão lidando com o contexto. Em um cenário em que o oferecimento de recursos financeiros para a manutenção desses projetos é limitada, a dinâmica de concorrência se torna cada vez mais materializada para ser contemplado por alguma dessas iniciativas governamentais.

Para onde vai o dinheiro público?

Nisia introduz a sua participação no diálogo, segundo ela, a partir da experiência, de quem tenta entender e obter acesso aos editais. A mestre afirma que desde as primeiras edições houve a falta de orientação sobre como produzir projetos culturais, panorama que permanece o mesmo nos dias atuais. Em vista disso, ela adiciona que os articuladores da cultura não se reconhecem como trabalhadores no ramo e, assim, não conhecem os seus direitos e as vias de reivindicação.

 

Em dado momento da live, quando Juliana Salles e Mariana Caires apresentam uma pesquisa elaborada por elas sobre dados estatísticos de determinados editais de fomento à cultura, Nisia também comenta que há a necessidade de refletir a respeito do destino e aplicação do dinheiro público. Ainda sobre esse tópico, ressalta que os editais não funcionam de forma democrática, poucos projetos são contemplados, e em cima dessa análise, questiona: como as coletividades das periferias se enxergam?

O aceso aos editais

O geógrafo conta, no início do debate, que sua atuação na cultura periférica quando ele e alguns amigos iniciaram um projeto na área com o objetivo de conciliar o lazer e a rotina acelerada de trabalho e estudos. A partir de então teve contato com os processos burocráticos de administrar uma iniciativa desse porte que, por sua vez, não foram nada fáceis de serem compreendidos e resolvidos.

Em cima dessa perspectiva, Marcello aponta, assim como Nísia, o problema da falta de acesso às políticas públicas e informações a seu respeito, o que piorou com o advento da pandemia. Também traz outro questionamento: como tornar esse acesso mais efetivo? De acordo com ele, a dinâmica atual acaba resultando na concorrência entre coletivos e ao mesmo tempo em que as autoridades dizem querer ampliar os recursos de fomento, não abrem espaço para incentivos fiscais, o que contribui com os obstáculos financeiros para manter os coletivos funcionando da forma adequada.

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